sábado, 29 de julho de 2017
Perdendo tempo - Dia I
quinta-feira, 13 de julho de 2017
Um incômodo sobre aborto e igualdade dos sexos
Um incômodo sobre aborto e igualdade dos sexos
Tem uma coisa me incomodando um bocadinho desde o voto do Barroso acerca da descriminalização do aborto ("até o terceiro mês" o caralho). Muitos dos argumentos ali usados são ruins e não são nada originais - de fato, parecem uma reciclagem "versão brasileira" de argumentos idênticos que circulam há muito tempo nos estudos sobre o assunto nos EUA (e talvez em outras partes do planeta).
O que me incomoda é o dito "argumento da igualdade". Tem todo aquele blá-blá-blá de hierarquização injusta, mas indo ao ponto, o argumento é que em razão de a mulher arcar com todo o ônus da gravidez ao passo que o homem não engravida, a igualdade plena implica irremediavelmente o acesso ao aborto.
Como já sabemos desde há muito tempo, o "feminismo que se preocupa com a igualdade / equidade / igualdade material / tratar os diferentes na medida de suas diferenças / fim das diferenças / what the hell" nunca existiu fora das folhas do dicionário, nem mesmo na onírica e idílica fantasia da assim-chamada primeira onda. E o caso aqui não seria lá muito diferente.
Sendo mais específicos aqui, então, meu argumento é sobre o outro lado da equidade.
De fato, a mulher é aquela que engravida, que gesta o rebento. Mas essa desigualdade não é tão fundamental quanto parece; explicando melhor, a desigualdade aqui é: os homens não podem engravidar.
"Duh! Isso é óbvio!" - Sim, é óbvio, mas é exatamente a parte mais negligenciada de toda essa discussão.
Explicitando um pouco mais: a reprodução humana é sexuada, depende de dois para acontecer. E, para o devido desenvolvimento do nascituro, é necessário um útero, algo que homens não podem possivelmente oferecer. Portanto, neste sentido, todo o interesse reprodutivo do homem - a saber, sua descendência - está à mercê da mulher.
A mulher precisa ficar em repouso e ser monitorada constantemente, deve seguir um estilo de vida mais controlado e balanceado, essas coisas todas. O homem, em princípio, não precisa fazer absolutamente nada disso; mas, mais fundamentalmente ainda, o homem é incapaz de fazer qualquer coisa, ao menos diretamente, em favor do seu filhote enclausurado no útero da fêmea. Se ele dormir mais ou menos horas no dia, isso não pode causar uma melhora ou piora nas condições do ainda-por-vir. Se ele toma menos ou mais cervejas, fuma menos ou mais cigarros, exercita-se mais ou menos horas, ingere mais ou menos ácido fólico, pouco importa, isso jamais causará melhora ou piora nas condições do pirralho.
(Óbvio que é sempre bom para qualquer homem cultivar uma vida saudável, tanto como um benefício para si mesmo quanto a fim de acompanhar e promover o desenvolvimento dos próprios filhos; porém, mesmo isso é um benefício indireto aos filhos.)
Note, por outro lado, que a mulher também depende do homem para a sua reprodução, mas mesmo essa dependência é muito mais contornável: ela poderia recorrer a uma inseminação artificial com espermatozoides advindos de um banco de sêmen, na hipótese mais desfavorável. Quer dizer, se uma mulher realmente estiver profundamente preocupada em deixar descendência, ela tem à sua disposição mais recursos que qualquer homem: a mulher só precisa de um espermatozoide, o homem precisa de uma mulher inteira.
Lembro-me destas tirinhas aqui, que afirma que o pai só toma completa consciência de que é pai quando pega o filho no colo:
Pois bem, reiterando: o homem não tem controle sobre o destino de seus filhos até o fim da gestação. Por um azar da natureza, ele é menos atrelado ao filho do que a mãe.
Assim sendo, homens enfrentam uma desigualdade naturalmente intransponível: eles dependem da mulher para sua reprodução.
Pois bem, a "igualdade" é um argumento tão ou até mais forte contra o aborto indiscriminado. Ainda que se alegue que o homem possa fugir de seus compromissos parentais, a lei neste sentido já assegura a assistência financeira (pensão) à mulher. Já existe um remédio legal contra esse problema - se ele é ou não devidamente aplicado, a questão é outra.
Agora, liberar o aborto simplesmente acentua essa desigualdade. Tanto que na Suprema Corte americana já foi determinado que a simples notificação, quanto mais a autorização, por parte do homem/pai para a realização do procedimento abortivo é ilegal.
Conclusão: pais não têm direitos parentais, nem mesmo para com os filhos mais frágeis. E, bem, não vejo as loquazes vozes "equitárias" dispostas a sanar esse problema...